Quem mandou matar Phillips é Bruno?
Declaração Marx Brasil 16/6/22
Ontem, 15 de junho de 2022, recebemos a confirmação do que suspeitávamos - o indigenista brasileiro Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram brutalmente assassinados na região do Vale do Javari - Amazônia brasileira. Os executores dos crimes, dois jagunços pobres do crime organizado, confessaram que atiraram com arma de fogo, esquartejaram, incineraram e enterraram partes dos corpos.
A grande imprensa e os militares do Governo Bolsonaro se comportam como se o caso estivesse resolvido. No entanto, o certo é que essa barbárie esconde outros crimes e outros criminosos: grandes empresas, agentes públicos das três esferas do poder republicano e as instituições do Estado Brasileiro.
É explícito que a situação de violência e miséria a qual estão submetidos os povos indígenas aumentou com a ascensão do Governo de Jair Bolsonaro, um governo que claramente emite sinais de proteção aos ataques feitos por garimpeiros, madeireiros, latifundiários e milicianos rurais contra as terras indígenas na Amazônia. Bolsonaro colocou militares e pastores evangélicos em lugares estratégicos do Estado, tal como na Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), da mesma forma que seu governo exonerou Bruno Pereira da direção da Coordenação Geral de Indígenas Isolados e de Recente Contato (CGIIRC), após Pereira enfrentar garimpeiros que atacaram a Terra Indígena Yanomami, em 2019.
Entretanto, é ilusório acreditar que esse estado de coisas é uma particularidade do atual do Governo Federal. Os governos locais, tais como o governo de David Bemerguy (prefeito de Benjamin Constant) e o governo de Denis Paiva (prefeito de Atalaia do Norte) são, na menos pior das hipóteses, cúmplices do assassinato de Bruno e Phillips e de tantos outros na região. Não por outra razão, os advogados de ambas as prefeituras se dispuseram a defender um dos assassinos. Mas para além disso, há ainda pelo menos duas determinações submersas nesse crime hediondo que o capital e os meios de comunicação não querem debater.
A primeira delas é que, assim como os jagunços atuam com o aval ideológico e logístico do Governo Bolsonaro, na destruição da Amazônia e na perseguição aos indígenas, Bolsonaro atua sob a conveniência do capital nacional e estrangeiro e das demais esferas de poder que comandam o Estado Brasileiro, isto é, o Poder Judiciário e o Poder Legislativo. Isso é possível observar se analisarmos atentamente as circunstâncias do assassinato de Bruno e Phillips.
Bruno Pereira não era apenas um grande especialista em territórios e povos indígenas (indigenista), mas um homem comprometido com a causa dos povos originários amazônicos. E nessa condição, Bruno ajudou os indígenas a organizarem um movimento de autodefesa e auto-organização - A União dos Povos Indígenas Vale do Javari (UNIVAJA). No mês de abril desse ano, a UNIVAJA, com a contribuição de Bruno, encaminhou para o poder judiciário (Ministério Público) diversas denúncias da atuação do narcotráfico em terras indígenas.
Entretanto, a Justiça nada fez diante dessas denúncias, tampouco a Polícia Federal, na cidade de Tabatinga-AM, ofereceu escolta a Bruno e a Dom Phillips no Vale do Javari, mesmo sabendo que ambos atravessariam um caminho perigoso dentro da selva para entregar provas dos crimes cometidos por narcotraficantes que usam uma comunidade de pescadores para o escoamento de armas e drogas. Ou seja, o Ministério Público e a Polícia Federal, no mínimo, lavaram as mãos e consequentemente foram cúmplices desse duplo assassinato que chocou o mundo, bem como certamente lavaram as mãos paras as dezenas de assassinatos contra indígenas e ambientalistas que atuam naquela região.
Soma-se a esse fato, a atuação direta de deputados, de diversos partidos burgueses, para atender os interesses das grandes mineradoras estrangeiras que contaminam os rios, tal como a mineradora norueguesa Hydro Alunorte e a mineradora canadense Potássio Brasil, deputados que atuam igualmente para atender os interesses de empresas envolvidas com o narcotráfico que exportam madeira para a Europa e EUA, além de atender os grandes grupos latifundiários responsável por exportação de commodities a partir do uso de terras indígenas e quilombolas.
Nesse caso, a atuação parlamentar para destruição da amazônica e dos seus povos originários não é exclusividade da atuação de deputados bolsonaristas. Alguns ficarão surpresos ao saberem que o principal agente das grandes mineradoras e defensor da legalização dos garimpos em terras indígenas no Norte do Brasil é o Deputado Sinésio Campos, do Partido dos Trabalhadores (PT), o mesmo partido de Lula e líder desse partido na Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas.
Por essa razão, nós da Marx Brasil não nutrimos esperanças que a resolução para os problemas dos povos originários e dos trabalhadores da Amazônia esteja nas eleições de outubro e na substituição de Jair Bolsonaro por Lula. Em primeiro lugar, porque os indígenas no coração da selva amazônica e as comunidades ribeirinhas acossadas pelo narcotráfico não podem esperar nem um minuto a mais, a morte está lá, agora, a espreita, olhando nos olhos de cada homem e mulher daquele pedaço do mundo, nesse exato momento.
Em segundo lugar, porque o atual patamar da luta de classes não nos permite ilusões - qualquer um que se disponha a administrar o Estado Burguês se comprometerá a colocar o aparato estatal a serviço da nova forma de acumulação de capital no Brasil, ou seja, para a acumulação baseada na extração e produção de bens primários-exportadores responsáveis pelo desmatamento da Amazônia, violência em terras indígenas e superexploração da força de trabalho, tudo o que for necessário para interligar a produção de bens primários às grandes cadeias produtivas do capital imperialista.
Por isso alertamos, no sistema capitalista os regimes políticos podem mudar, os governos também. Mas a lógica violenta do Estado não. É por isso que Chico Mendes foi assassinado na Amazônia, dois meses após o regime democrático liberal ser reinstalado no Brasil, em 1988, foi por isso que Dorothy Stang (Irmã Dorothy) foi assassinada na Amazônia, durante o Governo Lula, em 2005, e é por isso que Bruno e Phillips foram assassinados na Amazônia, em 2022, durante o Governo Bolsonaro.
Estamos seguros que a tarefa imediata para começar a resolver os problemas da Amazônia passa por derrotar Bolsonaro e o bolsonarismo nas ruas, agora. Mas passa também por destruir as instituições do Estado Burguês no Brasil, na América Latina e no mundo, instituições essas que protegem grandes negócios imperialistas que não apenas ameaçam os povos originários, mas que ameaçam toda a humanidade por meio de guerras, assassinatos, fome e destruição ambiental.
Justiça por Bruno e Phillips e para todos os que caíram em defesa dos povos originários
Pela autodeterminação e autodefesa dos povos indígenas!
Fora garimpo e mineradoras da Amazônia!
Em defesa do caráter comunal das terras indígenas!
Pela construção de um poder popular e operário na Amazônia e no mundo!